Flávio Carneiro
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O Leitor Fingido

Rio de Janeiro
Rocco, 2010. 208 p.
A Confissão


Ler, assim como escrever, é uma arte. É na relação entre leitura e escrita que são forjados os grandes clássicos da literatura, os elos inquebrantáveis entre leitor e autor. Relações que surgem nas impressões que o texto provoca no leitor e, por que não, que o leitor provoca no texto, nos inúmeros detalhes de uma trama policial, na força emocional de um poema ou um romance, na carga histórica e crítica política que está nas entrelinhas do mais simples parágrafo de um conto. O escritor Flávio Carneiro explora, e extrapola, todos estes aspectos em O leitor fingido.
Dessa vez, Flávio se coloca do outro lado do papel para analisar a relação com o texto a partir do ponto de vista do leitor. O livro é dividido em duas partes. Ambas falam sobre leitura, mas Flávio Carneiro vai além da palavra escrita, falando também de outras linguagens, como a cinematográfica. A primeira parte, Através do espelho (e o que o leitor encontrou lá) - título inspirado no livro de Lewis Carroll, compõe-se de fragmentos diversos sobre o tema. São divagações do autor das possíveis relações entre escrever e ler. Tais considerações aparecem entremeadas por breves narrativas envolvendo um suposto leitor - o leitor fingido - a meio caminho entre a biografia e a ficção.
É o caso da relação que Flávio estabelece entre o filósofo romano Sêneca e o cineasta russo Sergei Eisenstein. No texto, o autor identifica nos pensamentos de ambos algo mais do que a junção de dois ou mais elementos distintos: no texto, das palavras; no caso do cinema a técnica da montagem, que não só uniria duas ou mais imagens mas, sim, criaria um novo elemento que vai transcender aquelas imagens que a formam.
Flávio Carneiro também bebe na obra A arte de ler, do escritor Émile Faguet, na qual o francês diz que não há uma, mas inúmeras formas de ler. O autor defende ainda que se leia sempre devagar, não no sentido preguiçoso que se sugere, mas ler e reler, "desconfiando" do texto, como uma forma de se descobrir algo novo sempre a cada leitura e releitura. Esse ato de descoberta também ganha potencial por conta da complexa relação entre autor e obra, na qual o autor não tem apenas um, mas vários "eus", que estão em constante metamorfose ao longo do texto, como defende Foucault.
Já a segunda parte do livro - Álbum de retratos (o leitor em branco & branco) - mostra ensaios curtos sobre personagens leitores, tomados de contos e romances diversos. A ideia foi formar uma espécie de galeria (ou álbum de retratos) de tipos de leitor, espelhados em personagens e obras da predileção de Flávio Carneiro.
Em "O leitor amoroso", por exemplo, Flávio toma por base o conto "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector, para analisar a relação, quase erótica, entre a menina que adorava ler, mas não tinha como comprar livros, e o livro que lhe é oferecido em troca de sua sujeição a várias humilhações impostas pela menina gorda cujo pai é dono de uma livraria. É na relação quase carnal, de paixão entre a menina pobre e seu objeto de desejo que Carneiro desenvolve a reflexão sobre o amor pela leitura.
Em outro ensaio, "O leitor e o prazer", o autor analisa a figura do detetive amador Dupin, de O crime da rua Morgue, de Edgar Allan Poe. O autor goiano credita à habilidade única que o personagem tem de ler e decifrar o que lê - e o prazer que isto lhe proporciona - ao sucesso nas descobertas dos mistérios propostos por Poe em sua obra.
O leitor fingido é uma homenagem que Flávio Carneiro faz a um personagem que muitas vezes é esquecido na literatura, mas é o determinante para a perpetuação da escrita - seja ela em que linguagem for: o leitor.
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